sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

NEM TUDO QUE É LUXO É LIXO


Nunca entendi direito como é que as pessoas avaliam as coisas e colocam nelas uma medida de valor extremamente alta, uma apreciação econômica que, por vezes, chega a atingir preços inimagináveis. Não tenho dúvida de que ligado a isso está uma induvidosa campanha de marketing promovida pela mídia, e por aí vai. Em realidade, o valor intrínseco das coisas não é medido somente pela qualidade, senão não teríamos tanta porcaria sendo vendida em escala diametralmente oposta ao que realmente valem.
Não me interprete mal, porque aqui não estou me referindo a sociedades capitalistas, a mercados financeiros, tampouco falo sobre questões sociológicas, do tipo “tanta gente morrendo de fome e as pessoas gastando rios de dinheiro com isso ou com aquilo”. Não. Refiro-me a coisas que em outra época ou lugar, de fato, não teriam o menor valor; falo, por exemplo, de roupas de grife ou qualquer outro produto que venha a ser comercializado com um valor extremamente alto se comparado com outras coisas da mesma espécie, às vezes até que possuem a mesma qualidade.
A própria cultura, uma representação teleológica da arte, que é uma abstração, também é valorizada pelo fato de ter um valor econômico, ou seja, se vale mais, mais vale ser apreciada, mesmo que tenhamos a consciência de que nem tudo que seja caro é realmente o melhor. E é exatamente sobre esse produto de consumo, por que é isso que o mercado da arte representa para muitos, que vou tecer alguns comentários.
Resolvi falar sobre isso porque recebi um vídeo de uma experiência realizada pelo jornal “The Washington Post” num metrô de Nova York, em que um homem de camiseta e boné começa a tocar um violino para as pessoas que passam, durante aproximadamente 45 minutos, e praticamente ninguém imagina o que está acontecendo, quase ninguém para e aprecia o verdadeiro presente que estão recebendo, ou seja, não percebem o valor do que estão ouvindo, a exceção de uma mulher que, ao final, inclusive reconhece o artista.
É possível que nem todos admirem a arte, em qualquer de suas acepções, apesar de eu ainda não entender como, porque a cultura mede algumas questões primordiais em relação a um país, como a educação. Há até aqueles que nem gostem muito de arte, seja sob a forma que vier. Na verdade, como tudo na vida, há sempre aqueles que são contra, simplesmente. Mas é indiscutível que a arte tem o seu preço. O que questiono é se percebemos isso naturalmente ou se somos guiados a apreciá-la por padrões que nos são impostos, uma valorização que talvez nem exista. Por exemplo, imagine uma obra de um pintor pouco conhecido, mas que acabe sendo confundida como um quadro de Michelângelo, e avaliada em alguns de milhões de dólares. Indubitavelmente, chamaria a atenção dos meios de comunicação, e que, por conseqüência, a ela seria atribuído um valor realmente expressivo, acarretando um interesse acima da média, inclusive daqueles menos adeptos à arte renascentista.
Pois bem. Aquele homem no metrô era nada mais, nada menos, do que Joshua Bell, e para quem não o conhece, é considerado um dos maiores violinistas do mundo, e basta acessar qualquer vídeo dele no YouTube para se ter certeza disso. No metrô, ele estava tocando um instrumento raríssimo, um “Stradivarius” de 1713, avaliado em aproximadamente 03 (três) milhões de dólares, e em seu repertório, alguns dos maiores clássicos da humanidade. Dias antes havia tocado no Symphony Hall, de Boston, em que alguns dos melhores lugares chegavam a custar mil dólares. Concluiu-se, por óbvio, que as coisas somente são valorizadas dentro de um contexto.
De minha parte, acredito que se deve entender isso da seguinte forma. Ao lado deste contexto, ou mais precisamente antes dele, há uma questão conceitual, uma valorização pactuada, e que, ao final, acaba sempre sendo traduzida em números. Digo isso porque, não obstante a qualidade da arte desempenhada por Joshua – o que me parece indiscutível –, o seu valor acaba sempre sendo refletido através da ótica daqueles que vão lucrar com isso, e por isso é inegável o esforço para agregar uma contextualização perfeita, uma sintonia o mais adequada possível para que o artista venha a ser reconhecido como o melhor, e para que se possa cobrar caro por isso.
Dessa forma, cabe a mim tirar uma única conclusão: aquele artista, supostamente anônimo, poderia ser considerado uma pintura de renome sem moldura, um artefato de luxo sem grife, e é exatamente por isso que tudo aquilo que não tem uma etiqueta nos indicando o seu devido valor, ou por uma falta de apreciação valorativa pessoal, muitas vezes acaba indo parar na lixeira.

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